Grupo paralelo da reforma tributária critica lista do governo e devolução de tributo para baixa renda
22.mar.2024 às 12h17
Atualizado: 22.mar.2024 às 15h17
SÃO PAULO
Representantes do setor de alimentação que participam do grupo paralelo de regulamentação da reforma tributária defendem a desoneração ampla da cesta básica, sem qualquer restrição a produtos por questões nutricionais ou critério de renda do consumidor.
A devolução do imposto para pessoas de baixa renda, o chamado “cashback“, é amplamente rejeitado por produtores e revendedores de alimentos. A avaliação é que o sistema utilizado em vários países da América Latina e em outras regiões –e também no Rio Grande do Sul– não irá funcionar em todo o Brasil.
Na desoneração, o repasse ou não do benefício para o consumidor depende do setor privado. No cashback, a devolução é feita pelo governo.
Em seminário realizado na Câmara dos Deputados nesta quinta-feira (21), do qual participou apenas uma entidade não empresarial, houve a defesa de estender o benefício fiscal para produtos ultraprocessados, para os consumidores de maior renda e desonerar até a ração de animais domésticos, como cães e gatos.
Biscoitos recheados e salgadinhos são exemplos de alimentos ultraprocessados – Eduardo Knapp/Folhapress
A reforma aprovada em 2023 diz que caberá ao Congresso definir quais alimentos estarão na nova cesta básica nacional com alíquota zero e quais terão redução de 60% nos novos tributos.
O novo texto constitucional permite que alguns alimentos não sejam desonerados e que outros ainda tenham uma tributação adicional, com o Imposto Seletivo para itens prejudiciais à saúde.
Ainda não há uma proposta fechada, mas participantes do grupo paralelo já entregaram ao Ministério da Fazenda o pedido para que todos os alimentos tenham alguma desoneração (de 100% ou 60%) e que nenhum tenha taxação extra por questões nutricionais. A maioria das entidades empresariais que preparam um projeto alternativo ao do governo, no entanto, quer colocar praticamente tudo na alíquota zero.
“É um passo muito importante talvez discutir daqui a alguns anos, no futuro, a questão do cashback, mas a melhor saída, no momento atual da população brasileira, é de fato a gente pensar que os produtos, na maioria, estarão na cesta básica”, disse Eduardo Lourenço, consultor jurídico do Instituto Pensar Agro, que comandou o seminário.
O cashback foi criticado por representantes do setor de lácteos, de aves, suínos e ovos, de carnes e do comércio presentes ao encontro. Dois setores que não foram desonerados na reforma, saneamento e telecomunicações, pediram o uso do cashback como compensação.
Praticamente todos os presentes afirmaram que o país não tem um cadastro capaz de encontrar todos os brasileiros que precisariam ser beneficiados pelo cashback. Houve críticas às bases de informação do Bolsa Família e do Cadastro Único do governo federal.
A ideia de devolução de impostos sobre o consumo para os mais pobres foi apresentada pelo BID (Banco Interamericano de Desenvolvimento) há cerca de dez anos e também é defendida pelo Banco Mundial.
Ela parte da conclusão de que o sistema adotado por vários países ao longo do século passado —de dar benefícios tributários para determinados produtos— beneficiou principalmente a parcela mais rica da população e empresas do setor, e não os mais pobres.
Por isso, muitas economias optam agora por mecanismos de tributação personalizada: o imposto depende de quem consome e não do produto –além de ser pago pelo próprio governo.
Durante o encontro também houve críticas à iniciativa do Ministério do Desenvolvimento e Assistência Social, responsável pelo Bolsa Família, de se antecipar à regulamentação da reforma tributária e publicar uma lista de produtos que podem compor a cesta básica, utilizando critérios que consideram a alimentação saudável e nutricionalmente adequada.
Rafaela Vieira, do Pacto Contra a Fome, foi a única voz dissonante e elogiou a iniciativa do governo.
“O Pacto contra a Fome defende que a cesta básica nacional tenha alimentos in natura e minimamente processados em sua composição e que esses sejam os únicos itens com isenção integral de impostos.”
Citando recomendação de diversas organizações internacionais, como a FAO e a própria ONU, Vieira listou os únicos itens que deveriam ser isentos (frutas, legumes e verduras, raízes e tubérculos, cereais integrais, leguminosas, oleaginosas, aves, peixes frescos e ovos).
Anderson Trautmann Cardoso, da Confederação das Associações Comerciais Empresariais do Brasil, disse ter conversado com representantes do governo que tratam da regulamentação da reforma.
Segundo ele, está descartada a possibilidade de cobrar o Imposto Seletivo sobre qualquer alimento, desde que este seja pelo menos parcialmente desonerado.
“Foi sinalizado que essa é uma proposição que virá do próprio governo”, afirmou. “Aqueles alimentos que estão contemplados na redução de 60% não podem, pelo texto constitucional, ter a aplicação do Imposto Seletivo e é razoável que tenhamos a mesma regra também para a cesta básica.”
Trautmann defendeu antecipar na regulamentação a desoneração da nova cesta para 2025, em vez de esperar a transição entre 2027 e 2032.
Outro ponto debatido foi a questão da alimentação animal. A reforma colocou na Constituição a desoneração de 60% apenas para alimentos de consumo humano, mas não fez a mesma restrição em relação aos itens da cesta básica. Com base nesse ponto, a representante da Associação Brasileira da Indústria de Produtos para Animal de Estimação defendeu um benefício ainda mais amplo.
“É o momento para a gente corrigir essa injustiça tributária, nivelando a alimentação pet à alimentação humana”, disse Cláudia Horta.
“Ele também faz parte do orçamento da família brasileira que possui um animal de estimação.”