Reportagem do Valor Investe mostrou os impactos e mudanças trazidos com o novo marco cambial. O Dr. Marcos Catão, sócio do Maneira Advogados, foi ouvido para falar sobre o tema.

Veja como o novo marco cambial vai mudar sua vida

Voltar de uma viagem ao exterior e vender os dólares que sobraram para um amigo passa a ser permitido

Por Gabriela da Cunha, Valor Investe — Rio

30/12/2022

Entra em vigor neste sábado (31) o Novo Marco Regulatório do Câmbio. Previsto pela Lei 14.286/2021, a nova norma traz, entre outras novidades, a possibilidade de empresas e pessoas físicas operarem diretamente no mercado de compra e venda de moedas e promete simplificar as transferências internacionais. Veja alguns destaques da regulação que busca modernizar o mercado de câmbio, tornar os processos mais simples e ampliar a acessibilidade ao mercado.

Limite em viagens

Uma das consequências da nova lei que afeta a vida do investidor é, por exemplo, o aumento do limite de dinheiro em espécie que cada pessoa pode portar nas viagens internacionais, passando de R$ 10 mil para US$ 10 mil. Isso se aplica tanto para quem chega quanto para quem sai do Brasil.

Negociação entre pessoas físicas

A prática comum de voltar de uma viagem ao exterior e vender os dólares que sobraram para um amigo ou conhecido passa a ser permitida (até então, em tese, isso era proibido). A nova regra, porém, só vale para operações “eventuais e não profissionais”.

“A regulamentação da venda de até US$ 500 entre pessoas físicas, legalizando a venda do excedente de moeda de uma viagem, por exemplo, entre pessoas, é só um aspecto que facilita a vida do brasileiro”, ressalta Juliana Strohl, líder de Jurídico e Compliance da fintech Kamino.

Na prática, a autorização deve permitir que fintechs organizem esse mercado “peer to peer”, facilitando a reunião de pessoas interessadas em comprar e vender pequenas quantias de moeda.

Investimentos no exterior

A facilitação da realização de investimentos no exterior, que cada vez mais ganha o varejo nos últimos anos, também é esperada com a nova regra. “Isso inclusive deve ser impulsionado pela autorização para que instituições financeiras no Brasil abram contas em moeda estrangeira, o que até então era feito de forma muito estrita”, lembra Erik Oioli, sócio do VBSO Advogados.

Conta em moeda estrangeira

A lei diz que compete ao Banco Central (BC) regulamentar as contas em moeda estrangeira no país, inclusive quanto aos requisitos e aos procedimentos para abertura e movimentação. O BC afirma que existe a possibilidade de, gradualmente e com segurança, expandir a possibilidade de pessoas físicas e jurídicas serem titulares de contas em moeda estrangeira.

Conta no exterior

Abrir uma conta de depósito no exterior já era possível, mas a nova legislação amplia e reforça essa prerrogativa, ao afirmar que as instituições autorizadas pelo BC poderão alocar, investir e destinar para operação de crédito e de financiamento, no país e no exterior, recursos captados aqui ou lá fora.

Para as empresas que já oferecem o serviço, como a Nomad, fintech que permite a abertura de conta corrente em dólar em um banco norte-americano de forma 100% digital, a nova regulamentação é vista como oportunidade para ter condições operacionais mais competitivas e, com isso, ampliar e aprimorar os serviços aos clientes.

“O investimento necessário para cumprimento de obrigações regulatórias e processuais [chamado de custo de observância regulatória] deve ser menos oneroso”, diz Nathalia Rodrigues, diretora executiva da fintech que permite investimentos no exterior de forma já integrada com a contratação de operações de câmbio. “Com a simplificação de processos e a adoção da abordagem baseada em risco para avaliação das operações desejadas pelos clientes, vemos espaço para serviços de melhor qualidade e customizados”, complementa.

Mais competição

Outro efeito positivo esperado com a nova norma é o aumento de competição no mercado de cambio. Isso deve gerar ao consumidor o benefício da redução de taxas, segundo o diretor de regulação do Banco Central (BC), Otavio Damaso. Na avaliação dele, a nova regulação cambial facilitará a entrada de fintechs no segmento. “A nossa expectativa para os próximos anos, assim como a gente viu várias fintechs surgindo para preencher lacunas em pagamentos, é ver fintechs entrando para trazer mais racionalidade, comodidade e inovação em operações cambiais”, disse em evento da Associação de Comércio Exterior do Brasil.

Também entra no radar possibilidade de instituições de pagamento solicitarem autorização ao Banco Central para operar câmbio em movimentações de até US$ 100 mil, porém o prazo foi adiado para 01 de julho.

Menos burocracia

A prestação de informações ao Banco Central e negociações de comércio exterior também devem ser facilitadas. “Ainda hoje, fechar um contrato de câmbio não é uma tarefa necessariamente fácil e se explica em parte pela existência de regras muito antigas e de um histórico brasileiro de rigoroso controle da entrada e saída de divisas”, diz sócio do VBSO Advogados.

Para quem faz operações de câmbio de valor até US$ 50 mil, a quantidade de códigos usados para registrar a transação também deve diminuir. Devem ser adotados 10 códigos para a identificação das operações, o que deve trazer mais agilidade a boa parte do mercado, já que, atualmente, existem mais de 180.

Boa parte dessas regras foi colocada em audiência pública pelo Banco Central. Para Marcos Catão, sócio da área Tributária do Maneira Advogados, a nova proposta adequa o mercado à atual realidade de produtos financeiros. “Tinhamos um ecossistema viciado no que tange ao câmbio: restrições e duro compliance para as fintechs e plataformas; elevada carga fiscal e exigências burocráticas para novos entrantes. Não por outra razão, convivemos, há anos, com uma altíssima volatilidade do real e spreads elevadíssimos”, diz.

A espera da maior flexibilização do mercado cambial, no entanto, pode gerar um potencial efeito colateral que seria a dolarização da economia, diz Oioli, do VBSO Advogados. “Isso se torna um ponto de atenção sobretudo em casos de crises econômicas e instabilidade política que possam levar a fuga de reais para moedas mais fortes”, explica.

*Com informações do Valor PRO.

(Foto: Getty Images)

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